domingo, 19 de novembro de 2023

O Milagre Eucarístico de Turim (ano 1453)

Placa com a narração do milagre onde esse aconteceu, basílica do Corpus Domini, Turim
Placa com a narração do milagre onde esse aconteceu, basílica do Corpus Domini, Turim
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs






Na Basílica de Corpus Christi de Turim encontra-se uma grade de ferro que protege o lugar onde ocorreu o primeiro milagre eucarístico daquela cidade, em 1453.

No chão, atrás da grade, está escrito como ocorreu o milagre:

“Eis o lugar onde caiu prostrado o jumento que transportava o Corpo Divino. O lugar onde a Sagrada Hóstia, saindo de uma bolsa, elevou-se sozinha, descendo com clemência nas mãos dos cidadãos de Turim. Eis o lugar santificado pelo Milagre. Recordando-o e rezando ajoelhado, presta-lhe veneração com santo temor”. (6 de junho de 1453)
A igrejinha de Exilles onde foi perpetrado o roubo sacrílego
A igrejinha de Exilles onde foi perpetrado o roubo sacrílego
A história começou na cidade piemontesa de Exilles, na região de Alto Val Susa, fronteira com a França.

As tropas francesas de Renato d’Anjou lutavam contra as milícias italianas do duque Ludovico de Savóia.

Os franceses saquearam o vilarejo e entraram na igreja.

Um dos soldados forçou a porta do Tabernáculo e roubou o Ostensório com a Hóstia consagrada, envolvendo-a numa bolsa.

Montou depois num jumento e partiu para a cidade de Turim com a intenção de vendê-la.

Ele ingressou dissimuladamente na cidade no dia 6 de junho, quando se comemorava o Corpus Christi.

Na praça principal, perto da então igreja de São Silvestre, hoje do Espírito Santo – onde futuramente seria erguida a Basílica de Corpus Christi – o jumento empacou e caiu no chão.

Então a bolsa se abriu e o Ostensório com a Hóstia se elevou sobre as casas vizinhas para maravilhamento do povo.

Entre os presentes estava o padre Bartolomeu Coccolo, que foi correndo avisar o bispo Ludovico, da família dos marqueses de Romagnano.

O bispo, acompanhado por um cortejo formado pelo povo e pelo clero, se dirigiu à praça, prostrou-se em adoração e rezou com as palavras dos discípulos de Emaús “Permanecei conosco, Senhor”.

Afresco representando o milagre eucarístico de Turim
Afresco representando o milagre eucarístico de Turim
Naquele mesmo momento se verificou outro milagre: o Ostensório caiu no chão, deixando livre a Hóstia consagrada, que reluzia como o sol.

O bispo elevou o cálice que tinha nas mãos, e lentamente a Hóstia consagrada começou a descer, pousando dentro do cálice.

A devoção ao Milagre Eucarístico de 1453 foi imediatamente difundida por toda a cidade.

Turim promoveu a construção de um nicho no lugar onde ocorreu o fato sobrenatural.

Posteriormente, o nicho foi substituído pela Igreja dedicada ao Corpo de Cristo.

A atual Basílica do Corpus Domini construída para perpetuar a lembrança do milagre
A atual Basílica do Corpus Domini
construída para perpetuar a lembrança do milagre
O milagre foi comemorado especialmente nas solenidades organizadas por ocasião do cinquentenário e do centenário do milagre (1653-1703;1753-1853; e parcialmente em 1903).

São muitos os documentos que relatam o milagre.

Os mais antigos são três Atos Capitulares dos anos de 1454, 1455 e 1456, bem como alguns documentos da prefeitura de Turim.

No ano de 1853, o Beato Papa Pio IX celebrou solenemente o IV centenário do milagre.

Na cerimônia participaram São João Bosco e o Padre São Miguel Rua.

Para essa ocasião, Pio IX aprovou o Ofício e a Missa própria do milagre para a diocese de Turim.

No ano de 1928, Pio XI elevou a Igreja do Corpus Christi à dignidade de Basílica Menor.

A hóstia do milagre foi conservada até o século XVI.

Nesse século a Santa Sé ordenou consumi-la “para não forçar Deus a fazer um milagre eterno mantendo incorrupta, como estiveram até aquele momento, as próprias espécies eucarísticas”.





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domingo, 5 de novembro de 2023

Santa Genoveva: heroína que salvou Paris dos bárbaros

Santa Genoveva
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
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Em 451, Átila à testa de sua horda de hunos ameaçou Paris.

“A grama não volta a crescer onde pisa meu cavalo”, vangloriava-se o chefe bárbaro. Pois, ele tudo arrasava.

Santa Genoveva (419/422 ‒ 502/512) tinha só 28 anos mas, pela sua virtude e força de caráter, convenceu os habitantes de Paris de não abandonarem a cidade nem a entregarem aos pagãos.

Ela exortou os parisienses a resistir à invasão:

Restauração do túmulo. Saint-Étienne-du-Mont, Paris.
“Que os homens fujam se desejarem, se não são capazes de lutar mais.

“Nós, as mulheres, rogaremos tanto a Deus, que Ele ouvirá nossas súplicas”.

Os homens resistiram. E Átila afastou-se misteriosamente.

Santa Genoveva fez construir uma igreja sobre o túmulo de São Dionísio, primeiro bispo de Paris e mártir.

No local, depois surgiu a abadia de Saint-Denis onde foram enterrados os reis da França.

A Santa convenceu o rei Clóvis, primeiro monarca católico da França de erigir a igreja dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo.

Altar de Santa Genoveva. Igreja de Saint-Étienne-du-Mont, Paris
Quando Santa Genoveva morreu, com 89 anos, foi enterrada junto ao rei Clóvis, e da mulher dele, a rainha Santa Clotilde.

A barbárie igualitária da Revolução Francesa (1789) profanou o túmulo de Santa Genoveva.

Seu ataúde foi fundido pelos revolucionários, suas relíquias foram queimadas, as cinzas foram dispersas no rio Sena, e seu santuário acabou sendo demolido.

Os fautores ideológicos da profanação foram enterrados em face do ex-santuário da Santa: no Panteão de Paris!

Santa Genoveva, salvai a França e rogai por nós!






Vídeo: Santa Genoveva: a heroína que salvou Paris dos bárbaros






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domingo, 22 de outubro de 2023

Cantiga de Nossa Senhora de Castro Marim

Nossa Senhora dos Mártires, Castro Marim
Nossa Senhora dos Mártires, Castro Marim
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
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Esta cantiga refere-se ao surgimento da devoção a Nossa Senhora de Castro Marim (Algarve, século XII), especial protetora dos portugueses cativos dos mouros.


Captivo de um pêrro moiro
Em terras de moiraria
Debaixo de duros ferros,
Um pobre cristão vivia.

Negro pão e água turva
Só lhe davam por medida
De manhã até à tarde
A um moinho moia;
E à noite o perro infiel,
Com medo que lhe fugisse,
N’um caixão grande o fechava,
Muito forte em demasia.

Depois, em cima deitado,
Em tom de mofa dizia,
Como quem Deus não conhece,
Esta horrível heresia:
- Livre-se d’aqui agora
A tua Virgem Maria!

Chorava o pobre cristão,
Mas seus males não carpia.
A blasfêmia que escutava
Era o que só lhe doía.
Todo em lágrimas banhado,
Desta maneira dizia:
– Senhora! Que não castigas
Matriz de Nossa Senhora dos Mártires, Castro Marim
Matriz de Nossa Senhora dos Mártires, Castro Marim
Esta grande aleivosia?!
Se ele bem A invocava
Melhor a Senhora o ouvia.

Uma noite à meia noite,
O caixão que se movia!
Sem que ninguém lhe tocasse,
Ao mar direito corria!
O moiro, no melhor sono
Em cima d’ele dormia.
Adeus, terra de moirama!
A terra ao largo fugia...

Assim três noites vogaram,
Três noites e mais dois dias!
O moiro, como encantado,
Do sono não se bulia.

Já desponta a manhã clara,
Manhã do terceiro dia!
Novas areias se mostram,
Novos céus, nova alegria!

Já perto se ouve roncar
O mar pela penedia.
O ladrar de muitos cães
Por toda a costa se ouvia.
Da torre o galo três vezes
Este milagre anuncia!
Os sinos do campanário
Repicavam à porfia,
Sem que ninguém os tangesse,
Castro Marim
Castro Marim
Porque tudo inda dormia.

Com os sinos acorda o moiro,
Sem atinar com o que via.
Já muito contrito e humilhado
Para o captivo dizia:
– Cristão, que terra é esta
De tão alta senhoria?
Na tua terra, cristão,
Cantam galos à porfia,
Tocam sinos, ladram cães,
Logo ao despertar do dia?
– Esta terra sei que é minha,
Mas eu não a conhecia...
 Na minha terra, senhor,
Cantam cães, repicam sinos,
Logo ao despontar do dia...
– Ergue-se, cristão, perdoa-me
Todo o mal que eu te fazia:
Ontem eras meu escravo
Teu servo seu n’este dia.

Já todos vão, já se partem,
Caminho da santa ermida;
O moiro, por Deus tocado,
D’esta maneira dizia:
– Oh Mãe de Deus poderosa,
Piedosa Virgem Maria,
Perdoa-me os meus pecados
Que eu cristão me tornaria!

Brasão da Vila de Castro Marim
Brasão da Vila de Castro Marim

Para ver este milagre
Toda a gente ali corria;
Com seus gibões encarnados
Os da justiça assistiam.
Eis que aos pés da Virgem Santa
D’água uma fonte se abria;
Tão cristalina e tão pura;
Que linda que ela corria!
Com esta água bendita
Água de tanta valia,
Foi logo ali batizado
O moiro da Babaria.

E para maior milagre,
Ao cabo de sete dias
Mesmo no meio das águas
Um verde freixo nascia
Tão copadinho e tão verde,
Oh que bem que parecia!

Desde então ficou a Virgem
Tendo grande romaria;
De Portugal e Castela
Todos, ali, corre em seu dia.



(Fonte: Alberto Pimentel, “História do Culto de Nossa Senhora em Portugal”)






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domingo, 15 de outubro de 2023

Legenda da fidelidade

Coroação de Nossa Senhora, Fra Angélico, detalhe
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
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Conta-se que em tempos muito remotos havia um convento de monjas agostinianas, perto da cartuxa de Monte Alegre.

Havia entre elas — e era, por certo, a mais humilde — uma monja de família nobre, de alta linhagem e muito bela.

Numa tarde, um cavaleiro que habitava nos arredores do castelo desse lugar, por acaso viu-a no jardim, e de tal maneira impressionou-se por sua beleza, que não teve mais repouso.

Desde então o cavaleiro rondava todas as noites o jardim do convento, chegando ao extremo de escalar os muros e cantar em frente à cela da enclausurada.

Esta teve notícia dos padecimentos do jovem cavaleiro, e chorou amargamente por ser causa deles.

Sua humildade e sua religião não podiam suportar a situação que o cavaleiro lhe criava, rondando-a como se fosse do mundo.

Uma tarde, depois de rezar devotamente na capela do convento, pedindo conselho à Santíssima Virgem, tomou uma decisão heroica.

Ao chegar a noite, a monja esperou atrás da cela em que o cavaleiro escalava o muro do convento, como era seu costume.

Não teve que esperar muito tempo.

Apenas a lua despontou no céu, viu o cavaleiro que, colocando uma escada no muro, desceu em silêncio por ela, levando sua espada.

Saiu então a monja e se aproximou do cavaleiro, que estava trêmulo de emoção.

Ela então lhe disse que havia sabido do muito que por seu amor sofria tentações, e que não poderia consentir nisso.

E tampouco podia tolerar que todas as noites ele rondasse sua cela e lhe cantasse trovas, quebrando o espírito de clausura.

O cavaleiro referiu-se à sua extrema beleza.

Ao ouvir estas palavras, a religiosa respondeu que, como era sua beleza que causava suas tentações, estava decidida a destruí-la, para devolver à sua alma a tranquilidade que tinha perdido.

Dizendo isto, tirou uma adaga que trazia escondida embaixo do escapulário, e com um só golpe cortou o nariz.

A lenda não conta o que aconteceu com o cavaleiro, mas nos consta que naquele lugar nasceu um raro arbusto, de uma espécie desconhecida até então, que dava flores de cor vermelha e em forma de nariz.

Os cientistas do país asseguram que não há outro igual em toda a Catalunha.

Em várias ocasiões, procuraram extirpá-lo, mas renascia com maior louçania.

Puseram-lhe o nome de "arbusto de fogo", mas o povo, sempre amante do maravilhoso, o chama de "arbusto dos narizes".



(V. Garcia de Diego, "Antología de Leyendas de la Literatura universal" - Labor, Madrid, 1953, p. 147)




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