domingo, 28 de maio de 2023

O fim do mundo no Canto da Sibila e no Dies Irae

Canto da "profecía" da Sibila na Espanha
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs







Ainda hoje, nas catedrais e igrejas de Mallorca e Alguer, cidade da Sardenha, costuma-se entoar na Missa de Galo o Canto da Sibila. Trata-se de um drama litúrgico de melodia gregoriana.

O Canto da Sibila é uma tradição oriunda da Baixa Idade Média e tem muitas versões.

Sibila é uma personagem da mitologia grega e romana – dizia ser uma profetiza inspirada por Apolo, e que conhecia e anunciava o futuro.

De fato, houve diversas sibilas (ou adivinhas) pagãs que moravam em grutas ou perto de mananciais, com as quais consultavam os supersticiosos pagãos.

Elas falavam sempre em estado de transe, utilizando muitas anfibologias (=frases com duplo sentido) e em hexâmetros gregos que se transmitiam por escrito.

Em espanhol existe este ditado: “En brujas no se debe creer, pero que las hay, las hay” (“Nas bruxas não se deve acreditar, mas que as há, as há”). E as sibilas, por vezes iluminadas por potencias infernais, podiam dar a conhecer fatos que depois se verificavam.

Na mitologia pagã, a Sibila teria profetizado o fim do mundo. Essa profecia dizia coisas que se assemelhavam com a escatologia bíblica relativa ao fim dos tempos e ao Juízo Final.

Sibila representada na catedral de Amiens
Em pleno Império Carolíngio, um primeiro manuscrito em latim do Mosteiro de São Marcial, em Limoges (França) faz menção dela.

Evocando sempre sua remota e fantasiosa origem, o Canto da Sibila ilustrava os fiéis de que os espantosos acontecimentos que acompanharão o Fim do Mundo e o Juízo Final não são uma mera construção cristã.

Mas também é uma realidade incrustada em muitos povos pagãos, a qual até ministros do diabo anunciam por meio de seus obscuros profetas.

O nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo deu início à fase final da História humana: o Novo Testamento.

Esta fase terminará com a segunda vinda do Salvador como Rei e Juiz Universal para julgar toda a humanidade e separar os bons dos maus.

Foi para lembrar essa grande verdade que em catedrais e paróquias começou a se cantar o Canto da Sibila no Natal.

Sibila: canto na catedral de Mallorca
Essa prática piedosa teve muita aceitação no sul da Europa, em particular na Espanha, na França, na Itália e em Portugal.

Uma das versões mais famosas é a que se canta até hoje na catedral de Mallorca. O manuscrito com o texto é o mais antigo, conservado em latim, edos anos entre 1360 e 1363.

Entre 1463 e 1468, o Canto da Sibila era cantado em latim ou numa língua local por um sacerdote ou por um jovem. Hoje é por um cantor. Ele está voltando a ser cantado em muitas regiões, na Espanha notadamente.

O Canto da Sibila aproxima-se muito do conhecido hino Dies Irae (“Día da ira”), do século XIII, atribuído ao franciscano Tomás de Celano (1200-1260), amigo e biógrafo de São Francisco de Assis. Também é atribuído ao Papa São Gregório Magno e a São Bernardo de Claraval.

O Dies Irae descreve o dia do Juízo Final, com o som da trombeta convocando os mortos para comparecerem diante o trono de Deus.

Operar-se-á então a ressurreição da carne, verdade de fé que professamos no Credo. Todos os mortos hão de ressuscitar para ouvirem o justo juízo de Deus. Todos os eleitos serão salvos e reinarão eternamente no Céu. Todos os réprobos serão jogados nas chamas inextinguíveis do inferno.

Cantado nas Igrejas, o Dies Irae faz um paralelismo entre os anúncios feitos a respeito por David, profeta de Deus, e pela Sibila, profetiza dos infernos.

Dia da Ira, aquele dia
Em que os séculos se desfarão em cinzas,
Testemunham David e Sibila!


Juízo Universal no Fim do Mundo
Os dois cânticos preparam as almas para esse grande momento final da história humana em que “os Céus se enrolarão como um pergaminho”.

Nessa hora, o triunfo final do plano salvífico de Nosso Senhor ficará definitivo e sem apelação pelos séculos dos séculos.

SIBILA LATINA

Sinal do Juízo, a terra encharcar-se-á de suor.

Do céu descerá o Rei Sempiterno,
verdadeiramente presente em corpo e sangue, para julgar o mundo.

Os homens então rejeitarão as fantasias e qualquer tesouro,

o fogo vai queimar a Terra, correndo pela terra e pelo mar.

Romper-se-ão as portas do tenebroso inferno.

Mas toda a luz liberada será comunicada ao corpo dos santos.

O brilho do sol desaparecerá e as esferas do céu perderão sua alegria.

O céu ficará conturbado e o brilho da lua morrerá.

Todos os reis comparecerão perante o Tribunal do Senhor.

Fogo cairá do céu e um rio de enxofre.


Diz o católico hino Dies Irae, Dies illa

1 Dia da Ira, aquele dia em que os séculos se desfarão em cinzas, testemunham David e Sibila!

2 Quanto terror é futuro, quando o Juiz vier, para julgar a todos irrestritamente !

Juízo Final, Van-Eyck
3 A trompa esparge o poderoso som pela região dos sepulcros, convocando todos ante o Trono.

4 A morte e a natureza se aterrorizam ao ressurgir a criatura para responder ao Juiz.

5 o Livro escrito aparecerá e tudo que há no mundo será julgado.

6 Quando o Juiz se assentar o oculto se revelará, nada haverá sem castigo!

7 Que direi eu, pobre miserável? A que Paráclito rogarei, quando só os justos estão seguros ?

8 Rei de tremenda Majestade, que ao salvar salva pela Graça, salva-me, fonte Piedosa.

9 Recordai-vos, piedoso Jesus, de que sou a causa de Vossa Via; não me percais nesse dia.

10 Resgatando-me, sentistes lassidão, me redimistes sofrendo a Cruz; que tanto trabalho não tenha sido em vão.

11 Juiz Justo da Vingança Divina, dai-me a remissão dos meus pecados, antes do dia Final.

12 Clamo, como condenado, a culpa enrubesce meu semblante suplico a Vós, ó Deus!

13 Ao que perdoou a Madalena, e ouviu à súplica do ladrão, dai-me também esperança.

14 Minha oração é indigna, mas, pela Vossa Bondade, não me deixeis perecer cremado no Fogo Eterno.

15 Colocai-me com as ovelhas. Separai-me dos cabritos. Ponde-me à Vossa direita;

16 Condenai os malditos, lançai-os nas flamas famintas, chamai-me aos benditos.

17 Oro-Vos, rogo-Vos de joelhos, com o coração contrito em cinzas, cuidai do meu fim.

18 Lacrimoso aquele dia no qual, das cinzas, ressurgirá, para ser julgado, o homem réu.

19 Perdoai-os, Senhor Deus, Piedoso Senhor Jesus, dai-lhes descanso eterno, Amém!


Vídeo: o canto da Sibila



Vídeo: Dies Irae, dies illa (gregoriano)




domingo, 14 de maio de 2023

Santo Rosário: devoção que Nossa Senhora deu contra os hereges

Nossa Senhora da o terço a São Domingos de Gusmão, Orações e milagres medievais
Nossa Senhora entrega o terço a São Domingos de Gusmão
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
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O Rosário é uma série de orações, acompanhadas de meditação em honra da Santíssima Virgem.

Chama-se Rosário porque é como uma coroa de rosas que se oferece a Maria. A oração principal do Rosário é a Ave Maria.

O Rosário tem por autor S. Domingos, fundador da Ordem dos Pregadores ou Dominicanos, cuja forma final recebeu de Nossa Senhora.

O uso de honrar a Maria rezando repetidas vezes o Padre Nosso, a Ave Maria e o Glória Patri foi inaugurada no século V por Santa Brígida, abadessa de um mosteiro de beneditinas na Irlanda.

Para facilitar tal prática, sujeitando a uma ordem invariável as orações que a compunham, Santa Brígida serviu-se de contas de diferentes tamanhos, enfileiradas em forma de coroa.

São Domingos, aperfeiçoando esse terço de acordo com as indicações de Maria, formou o Rosário tal qual hoje existe.

No século XV, tendo decaído o uso do Rosário, pela desgraça dos tempos, Deus suscitou o Bem-aventurado Alain de la Roche, dominicano bretão, para restabelecê-lo em todo o seu brilho.

Segundo vários documentos pontifícios, S. Domingos teve sobre o Rosário uma revelação particular de Maria, por volta do ano 1206.

Nossa Senhora da o terço a São Domingos de Gusmão, Orações e milagres medievais
Nossa Senhora entrega o terço a São Domingos de Gusmão
Os albigenses eram assim chamados porque eram numerosíssimos na parte da província do Languedoc chamada Albi.

Formavam uma seita na qual se praticavam monstruosidades morais.

Admitiam dois princípios, o bem e o mal, não acreditavam nas Escrituras, nem no batismo das crianças, nem no matrimônio; não queriam nem templos, nem bispos nem padres, e negavam a verdade do sacrifício da Missa.

Seus costumes eram corruptos, e sua ignorância extrema.

Animados pelo Conde de Tolosa e por grande número de nobres, os albigenses quebravam as cruzes, queimavam as igrejas, matavam sacerdotes e revoltavam-se contra qualquer autoridade eclesiástica.

Para conter essa torrente devastadora, a Igreja tratou de converter à Fé essas almas transviadas e mandou-lhes missionários, entre outros Dom Diego, Bispo de Osma (na Velha Castela), e seu arcebispo Domingos de Gusmão, tão célebre depois sob o nome de São Domingos.

Esses homens apostólicos puseram mãos à obra, com ardor, mas seu zelo teve pouco êxito. Aflitíssimo pela esterilidade de seus esforços, Domingos dirigiu-se à Mãe de Deus, que tinha o poder de destruir as heresias.

Suplicou, conjurou até com lágrimas, para que esta boa Mãe o auxiliasse e lhe inspirasse o meio de vencer a obstinação desses fanáticos.

Nossa Senhora do Rosário, na igreja de San Domenico, Bolonha
Maria ouviu a oração de seu servo e lhe apareceu. De acordo com a tradição, a aparição se deu em Castelnauday, numa aldeia chamada Prouille.

Ela o consolou e lhe disse: "Meu filho Domingos, aprenda isto: o meio empregado pela Santíssima Trindade para reformar o mundo foi a Saudação Angélica.

Portanto, se quiser converter esses corações empedernidos, pregue-a segundo o modo que vou ensinar-lhe". Indicou então a organização do Rosário, composto de 3 terços, ou 15 dezenas, a cada qual corresponde um mistério de nossa Fé.

Com esta poderosíssima arma Domingos pregou outra vez, com novo ardor. Ensinou a Fé, propagou a devoção do Rosário, e os frutos da conversão se multiplicaram com prodigiosa rapidez.

Os progressos dessa devoção foram tais, que cinqüenta anos depois da aparição de Maria milhares de hereges tinham voltado para o seio da Igreja e milhares de pecadores tinham abraçado a penitência.

Durante a sua vida, o próprio São Domingos converteu mais de cem mil almas, segundo dizem autores do tempo.

Tal é a origem da preciosa devoção do Rosário, baseada em tantos testemunhos, autorizada por tantos milagres, honrada pela Igreja com tantos privilégios e continuamente aprovada pelo Céu com um sem número de graças, que Deus gosta de distribuir entre os que a praticam.



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quarta-feira, 26 de abril de 2023

A traslação miraculosa de Nossa Senhora do Bom Conselho
da Albânia até Genazzano, Itália


Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
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Numa pequena localidade da Itália a graça faz germinar, em substituição a um velho culto pagão, uma terna devoção a Nossa Senhora sob o título do Bom Conselho.

A imagem desceu miraculosamente na cidade de Genazzano no fim da tarde do dia 25 de abril de 1467.

Sua festa se comemora no dia 26 de abril.

Naqueles anos, um rei valoroso após épica gesta caiu sob a espada dos invasores muçulmanos. Não houve quem o substituísse à altura e o reino se encontrava em triste declínio.

Declínio político e militar, por certo, mas também e principalmente declínio religioso.

Santuário de Nossa Senhora do Bom Conselho, Genazzano
Santuário de Nossa Senhora do Bom Conselho, Genazzano
Os católicos albaneses oferecem ao Islã a resistência ineficaz de um povo tornado tíbio. Com isto, a vitória das hostes de Mafoma resulta inevitável.

Dois homens fiéis à Virgem se sentem perplexos, e vão ao santuário nacional da Albânia, em Scútari.

Eles implorararam à imagem dEla que ali se venera um bom conselho: o que fazer?

Permanecer na nação dominada pelos turcos, a fim de ali servir à Santíssima Virgem, ou deixar a pátria rumo a plagas em que possam viver sem grave perigo para a fé?

O bom conselho implorado lhes foi concedido sob a forma mais estupenda e inesperada.

A imagem deixa Scútari, e em pós dela partem os nossos dois albaneses.

A confirmar a autenticidade e o acerto deste conselho, a sagrada Efígie baixa maravilhosamente no local de Genazzano.

Daí para diante, a história da Madona transladada de Scútari não foi senão uma sucessão de triunfos morais.

Quer em Genazzano, quer em outras cidades onde reproduções do quadro albanês foram expostas à veneração dos fiéis, se multiplicaram incontáveis as graças de toda ordem.

E entre elas o atendimento frequente das pessoas que, desejosas de um bom conselho, acorrem à Virgem, implorando a graça de uma luz para sua perplexidade.

Nossa Senhora do Bom Conselho, Colégio São Luís, SPEntre essas imagens, importa lembrar a que se encontra na cidade de São Paulo.

E início na  Capela do Colégio São Luís, dos RR. PP. Jesuítas, e depois na menor capela moderna do mesmo colégio.

A causa foi o modo pelo qual chegou a nosso País é verdadeiramente digno de especial atenção. (foto ao lado)




(Autor: Plinio Corrêa de Oliveira, "Catolicismo", Abril-Maio de 1968)





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domingo, 16 de abril de 2023

Intimidade de duas mães

Rocamadour: imagem que resgatou muitos escravos cristãos da escravidão dos maometanos
Rocamadour: imagem que resgatou muitos escravos cristãos da escravidão dos maometanos
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
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O Bem-aventurado bispo de Gênova Jacques de Voragine conta que uma viúva tinha um filho único, a quem queria muito.

Sabendo que ele tinha sido feito prisioneiro pelos inimigos, acorrentado e posto na prisão, ficou profundamente triste.

Dirigindo-se a Nossa Senhora, por quem tinha devoção especial, pediu-lhe com insistência a liberdade de seu filho. Passou-se um tempo, e ela não viu o fruto de suas preces.

Dirigiu-se então a uma imagem de Maria com o Menino Jesus ao colo, na igreja, e disse:


— Santa Virgem, eu vos supliquei a liberdade de meu filho e não quisestes vir em socorro desta mãe infeliz. Implorei vossa proteção para meu filho, e a recusastes. Assim como meu filho foi levado, levarei o vosso, e o guardarei como refém.

Dizendo isso, tomou a imagem do Menino do colo da Virgem, levou-a para casa, envolveu-a em linho, e colocando-a em um cofre, fechou-a à chave, contente por ter um tão bom refém como garantia da volta de seu filho.

Na noite seguinte Nossa Senhora apareceu ao rapaz, abriu-lhe a porta da prisão e lhe disse:


— Diz à tua mãe, meu rapaz, que ela entregue meu Filho, agora que entreguei o dela.

O rapaz foi encontrar-se com sua mãe e relatou-lhe a miraculosa libertação. A mãe, radiante de alegria, apressou-se a entregar o Menino Jesus a Nossa Senhora:


— Eu vos agradeço, celestial Senhora, por me restituirdes o filho, e em troca restituo o vosso.

(Fonte: Jacques de Voragine, "La Legende Dorée")



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