domingo, 22 de janeiro de 2012

Sublime equilíbrio ante a lepra (2)

O Bom Samaritano, igreja paroquial de Buckland, Inglaterra



Foi principalmente depois das peregrinações na Terra Santa e nas Cruzadas que a lepra se tinha espalhado pela Europa. Essa origem aumentava seu caráter sagrado.

Uma Ordem de Cavalaria, a de São Lázaro, fora fundada em Jerusalém para se consagrar exclusivamente aos cuidados dos leprosos, e tinha um leproso como grão-mestre; e uma Ordem feminina devotara-se ao mesmo fim na mesma cidade, no hospital Saint-Jean l’Aumônier.

Certa vez que o Bispo Hugo de Lincoln – do Franco-Condado por nascimento e cartuxo por religião – celebrava a Missa, admitiu os leprosos ao ósculo da paz; e como seu chanceler o lembrasse que São Martinho curava os leprosos beijando-os, o Bispo respondeu:

‒ “Sim, o ósculo de São Martinho curava a carne dos leprosos, mas a mim é o ósculo dos leprosos que cura minha alma”.

Entre os reis e os grandes da terra, nossa Isabel não foi a única a honrar Cristo nos sucessores de Lázaro. Príncipes ilustres e poderosos consideravam esse dever como uma das prerrogativas de suas coroas.

Roberto, Rei da França, visitava sem cessar seus hospitais.


São Luís tratava-os com uma amizade toda fraterna, visitando-os no Quatre-Temps, e osculava suas chagas.

Henrique III, Rei da Inglaterra, fazia o mesmo.

São Wulstan, bispo, Grã-Bretanha
A condessa Sibila de Flandres, tendo acompanhado seu marido Teodorico a Jerusalém, em 1156, passava o tempo que o conde empregava em combater os infiéis no hospital de Saint-Jean l'Aumônier para aí cuidar dos leprosos.

Um dia em que ela lavava as chagas desses infortunados, sentiu, como nossa Isabel, seu coração sublevar-se contra tão repugnante ocupação. Mas, logo em seguida, para se castigar, tomou na boca a água da qual acabava de se servir e a engoliu, dizendo a seu coração: “É preciso que aprendas a servir a Deus nesses pobres; eis teu oficio, mesmo que arrebentes”.

Quando seu marido deixou a Palestina, ela pediu-lhe permissão para aí ficar, a fim de consagrar o resto de seus dias ao serviço dos leprosos.

Seu irmão, Balduino III, Rei de Jerusalém, juntou seus rogos aos daquela heroína da caridade; o conde resistiu prolongadamente, e não consentiu em separar-se de Sibila senão depois de ter recebido do Rei, seu cunhado, como recompensa pelo sacrifício, uma gota do Sangue de Nosso Senhor, recolhido por José de Arimatéia, na ocasião da deposição da Cruz.

Ele, então, retornou só à sua pátria, levando consigo esse tesouro sagrado, que foi depositar em sua cidade de Bruges; e os piedosos povos de Flandres tomaram conhecimento com grande veneração de como seu conde tinha “vendido” sua esposa a Cristo e aos pobres, e como ele lhes trazia, como preço desse “negócio”, o Sangue de seu Deus.

São Chad primeiro bispo de Lichfield, Grã-Bretanha
Mas, sobretudo, foram os santos da Idade Média que testemunharam aos leprosos um devotamento sublime.

Santa Catarina de Siena teve suas mãos atingidas pela lepra ao cuidar de uma velha leprosa que ela própria quis amortalhar e enterrar; mas, depois de ter assim perseverado até o fim no sacrifício, viu suas mãos tornarem-se brancas e puras como as de um recém-nascido, e uma suave luz sair das partes que tinham sido mais atacadas.

São Francisco de Assis e Santa Clara, sua nobre seguidora; Santa Odília da Alsácia, Santa Judite da Polônia, Santo Edmundo de Canterbery, e mais tarde São Francisco Xavier e Santa Joana de Chantal compraziam-se em proporcionar aos leprosos os mais humildes serviços. Freqüentemente suas preces obtinham uma cura instantânea.

É no seio dessa gloriosa companhia que Santa Isabel de Hungria ocupava já lugar pelos anseios invencíveis de seu coração para o Deus que ela sempre via na pessoa dos pobres; mas, enquanto esperava poder gozar com eles as alegrias eternas no céu, nada bastava na terra para aquietar o ardor da compaixão que devorava seu coração, nem para curar os langores dessa alma enferma e dilacerada pelos sofrimentos dos seus irmãos.

(Fonte : Charles de Montalembert, “Histoire de Sainte Élisabeth de Hongrie”, Pierre Téqui, Libraire Éditeur, Paris, 1930, T.11, pp. 114-122)



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