São Martinho de Tours divide sua capa com o pobre que resultaria ser Jesus Cristo. Museu de Cluny. Paris |
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de política internacional, sócio do IPCO, webmaster de diversos blogs |
No ano 316, na cidade de Sabária/Savária (atual Szombathely), antiga província romana de Panónia, atual Hungría, num tempo em que a Hungria não havia sido invadida pelos húngaros, a oeste do rio Danúbio, nascia Martinho no nobre berço do tribuno romano.
A família de Martinho obviamente não era cristã e adorava os falsos deuses greco-romanos, mas ele haveria de ser um dos promotores da maior e mais rápida cristianização da Europa.
Sua estirpe o conduziu a oficial das legiões romanas, então dominadoras da Europa. Logo ficou centurião (comandante de cem homens).
Porém, a graça tocou o coração do romano Martinho.
Apenas com vinte anos, chefes e soldados tinham um muito alto conceito do oficial pela sua coragem e generosidade.
Certa feita, perto das portas da cidade de Amiens, reparou um pobre miserável que morria de fio. Ninguém se incomodava impregnados como estavam dos duros costumes pagãos romanos.
Martinho então se despojou de sua prestigiosa capa de oficial e a cortou pela metade com a espada que havia usado no campo de batalha contra os inimigos do poder imperial.
Pegou uma das metades e cobriu o pobre. Nessa noite, Cristo lhe apareceu em sonhos dando-lhe a entender que esse pobre era Ele próprio.
Tornou-se cristão e discípulo de Santo Hilário de Poitiers, Doutor da Igreja notabilizado na Teologia, e foi contemporâneo de Santo Agostinho, bispo de Hipona (354–430), um dos máximos doutores da Igreja.
Martinho era um homem culto, porém sua ação apostólica no exercício da caridade, do ensino, na fundação e construção de igrejas, mosteiros e escolas o distinguiram e notabilizaram.
A sua ação missionária e pedagógica foi tão importante na catolização da Gália, cujo centro era a França, que ficou apelidado de apóstolo da Gália ou “Pai das Gálias”.
São Martínho de Tours, St Saviour's in Pimlico, Londres |
Martinho não abandonou suas viagens apostólicas, visitava todas as paróquias, zelava pelo culto e pela conversão dos pagãos politeístas, contrariamente ao que hoje prega o ecumenismo.
Não era nada fácil. Numa volta da estrada, ou mais bem sendeiro, deparou-se com um bando de pagãos de língua estranha.
Um deles apresentou-lhe o cadáver de uma menina. O gesto era eloquente: pedia para ressuscitá-la.
E se não ressuscitava o que lhe iria a acontecer?
Ele abençoou o corpo, a menina ressuscitou e a horda se converteu.
Perto de Tours fundou o mosteiro de Marmoutier.
São Martinho foi bispo por vinte e cinco anos.
Aos oitenta e um anos de idade, afirmava: “Senhor, se o vosso povo precisa de mim, não vou fugir do trabalho. Seja feita a vossa vontade”.
Faleceu na cidade de Candes de Saint Martin, no dia 8 de novembro de 397. Foi enterrado em Tours onde seu túmulo se transformou no maior polo de romarias da Cristandade nascente.
A cidade ficou independente, cunhava sua própria moeda, era uma potência financeira, atraia as multidões e era circundada por muralhas e grande número de torres militares.
Os reis da França faziam questão de peregrinar a ela. E quando os muçulmanos a ameaçaram cobiçando suas formidáveis riquezas doadas pelos fiéis, o conde de Paris acudiu a libertá-la.
Em recompensa o bispo-abade da cidade independente lhe deu como presente um pedaço da metade da capa zelosamente venerada no santuário.
A partir dali a família que reinaria um milênio sobre a Franca ficou conhecida como Capeto, porque ganhou um pedaço da capa do Pai da França.
Essa meia capa era venerada num recinto que passou a se chamar em latim ‘capella’ (pequena capa), chapelle em francês, ‘capela’ em português e “capilla” em espanhol.
Essa é a origem da palavra que define todo tipo de oratórios, até portáteis que levavam reis e exércitos em viagens e campanhas.
O sacerdote que acompanhava a relíquia passou a ser denominado capelão porque rezava a missa nela, quer dizer, na capela. O termo se estendeu a todo no catolicismo
É inúmera a quantidade de cidades, profissões, grupos, etc. que escolheram São Martinho como padroeiro.
São Martinho de Tours, busto-relicário na sua basílica em Tours |
Em 20 de outubro de 1580, os governadores dos escassos moradores da recém fundada Buenos Aires se reuniram num simples rancho de taipa onde depois seria feito o Cabido, ou prédio municipal.
Foram escolher o santo patrono do aldeiamento. O governador Juan de Garay e uns poucos vizinhos seguiram as normas comuns: jogaram pedaços de pergaminho com nomes de santos no capacete de um arcabuzeiro.
E saiu São Martinho de Tours! A decepção foi geral: era um ‘francês’! A eleição foi impugnada. Os nomes voltaram todos para o capacete, e novo sorteio.
O tabelião Pedro Fernández tirou a sorte leu o nome do novo escolhido. Novo? Novo nada, era mais uma vez São Martinho de Tours!
Não podia ser! O pergaminho foi mandado de volta para o capacete.
Mais um sorteio e mais uma vez saiu o nome do indesejado ‘francês’. A terceira vez dera o mesmo resultado: o ‘francês’!
Os residentes da aldeia de Santa Maria del Buen Ayre não tiveram mais jeito que acatar a vontade do Céu.
É uma das tradições mais antigas da imensa urbe portenha lembrada liturgicamente todos os dias 11 de novembro na Catedral Metropolitana, como reconhece “La Nación”.
E tudo começou com um pobre miserável – o próprio Cristo? – e um glorioso comandante de guerra romano vindo da hoje esquecida Panonia ainda não batizado, nas portas de uma cidade da França ainda nascente.
Maravilhas da graça de Deus que mostram como só a Igreja Católica é verdadeira. Festa litúrgica principal: 11 de Novembro.
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